Séries alemãs  Atração dupla: estrelas interpretam estrelas

Karl Lagerfeld, played by Daniel Brühl, is seen in a close-up. © Disney 2024

Na série “Becoming Karl Lagerfeld”, o ícone da moda, é interpretado pelo ator Daniel Brühl, um astro da Marvel. Essa cinebiografia é apenas uma entre várias séries e diversos filmes recentes em que um nome conhecido do cinema encarna nas telas uma figura histórica.

Com um pijama de seda com estampa de Pierrot e uma blusa de babados, Karl Lagerfeld está sentado sobre uma cama de seda vermelha, com uma barra de chocolate na boca. Ouvimos sua voz no trailer de Becoming Karl Lagerfeld: “Estou cansado de ninguém me levar a sério”. O drama, de seis episódios, acompanha o superestar da moda aos 38 anos — um estilista de prêt-à-porter relativamente desconhecido, que encontra seu caminho e sua assinatura característica em meio a paixões e disputas ardentes.

A Produção é tão suntuosa quanto a vida do estilista

O ator alemão-catalão Daniel Brühl foi elogiado no lançamento da série no Festival de Cannes, onde um animado desfile de moda antes da apresentação do primeiro episódio entusiasmou o público. Além do leque, do rabo de cavalo, das luvas e dos óculos escuros, Brühl capta o caráter de Lagerfeld: ambicioso, sarcástico, tão autoconfiante quanto desajeitado. A visão de Lagerfeld, maior do que a vida, reflete-se no valor da produção da série, com 3 mil figurinos, 2.200 figurantes e mais de 40 cenários — tudo encenado em Paris, Mônaco e na Roma dos loucos anos 1970.

Perspicaz, eloquente, engraçado, encantador

Lembranças de Daniel Brühl do estilista

As cinebiografias permitem um enfoque único, um mergulho profundo em uma vida extraordinária para além do glamour superficial, uma visão de bastidor sobre um talento complexo e extraordinário. “Eu só conheci mesmo a personagem que ele criou”, lembra-se Brühl em uma entrevista à revista Deadline de seu breve encontro com Lagerfeld em uma sessão de fotos da Berlinale, quando o então jovem ator estourou, há 20 anos, com Adeus, Lênin!.

Nesta série, “eu quis romper esse escudo e descobrir quem era a pessoa”, diz Brühl. Perspicaz, eloquente, engraçado e encantador — essas são as lembranças que o ator tem do estilista. Brühl tentou compreender o que chamou de estilo de vida contraditório de Lagerfeld e suas adulterações biográficas através da leitura de biografias e entrevistas com o estilista e de conversas com pessoas que conheceram Lagerfeld quando ele vivia em Paris.
  Para Brühl, essa não foi a primeira oportunidade de interpretar uma personalidade conhecida nas telas. No passado, ele já representou celebridades, como por exemplo o intrépido Nikki Lauda, piloto de Fórmula 1. Embora as cinebiografias alemãs sejam menos conhecidas que as de Hollywood, há aquelas que ficaram na memória. Barbara Sukowa, por exemplo, já interpretou várias feministas icônicas, entre elas Hannah Arendt, Rosa Luxemburgo e Hildegard von Bingen. Outras cinebiografias contam a vida de nazistas (A queda, por exemplo, ou Robert Stadlober no papel de Goebbels, a ser lançado em breve) ou de dissidentes (como por exemplo Sophie Scholl, Gundermann, em breve Jonas Dassler como Bonhoeffer). Brühl recusou-se, contudo, a assumir um papel em particular: o de Hitler, que ele rejeitou duas vezes.

Cinebiografias: um negócio em expansão

Em uma boa cinebiografia, interessa menos a verdade ou uma narrativa exata da vida da pessoa retratada e mais um bom roteiro e a ligação entre uma personalidade fascinante e enigmática e a curiosidade por personagens fortes por parte de quem assiste. O público sente-se atraído por figuras não conformistas e deseja desvendar os segredos da fama e do sucesso.

A representação na cinebiografia com “estrelas interpretando estrelas” tem um caráter de atração dupla (também para os setores de marketing): a escolha sublinha sempre a semelhança física, bem como a capacidade de transformação de quem interpreta, convidando o público a explorar as linhas de conexão entre ator/atriz e personalidade real. Cinebiografias de artistas por artistas são o auge da (auto)representação, contendo a receita para a fama e a fortuna e, portanto, se encaixando perfeitamente em nossa era de influencers.

Bem perto das estrelas

Para quem não se cansa do gênero cinebiografias e está querendo se inspirar por histórias de gênios, não faltam ofertas: Timothée Chalamet como Bob Dylan, Kingsley Ben-Adir como Bob Marley, Tom Holland como Fred Astaire, Billy Porter como James Baldwin, Jeremy Allen White como Bruce Springsteen e Angelina Jolie como Maria Callas — esta última em um dos raros retratos de artistas mulheres. Talvez a raiz do interesse renovado por filmes biográficos de celebridades esteja no “tornar-se” — o momento de metamorfose propício à mídia social, o momento no qual alguém se destaca, faz sucesso, ganha fama. O público sente que pode compartilhar daquele sonho e estar perto de alguém com carisma invejável, eventualmente até mesmo se colocando na pele de seu ídolo.

De Elvis a Amy Winehouse, o que há em comum entre as pessoas retratadas nas cinebiografias, por meio de lutas e mudanças, é que elas deixaram rastros, mudaram seus contextos e continuam a ser assunto de debate: controversas, heroicas — e com frequência as duas coisas. As emoções ficam à flor da pele: amores apaixonados, festas loucas, ciúme avassalador, ambição feroz, egomania destrutiva, decisões corajosas contra a maré e desprezo das convenções de gênero ou de outros papéis sociais impostos.

Kruger encontra Dietrich

Muito disso se aplica a Marlene Dietrich, que será interpretada por Diane Kruger em uma minissérie de cinco episódios intitulada Marlene Dietrich — uma mulher na guerra, mais um caso de estrela encarna estrela. Kruger, ex-modelo e atriz, procurou o diretor Fatih Akin, que levou recentemente às telas a vida do rapper Xatar em Rheingold, para retratar a vida de Dietrich nas telas como artista e emigrante alemã. Após o longa de ficção Amrum, também uma colaboração entre Akin e Kruger, que está sendo filmado em 2024 e será lançado em setembro de 2025, o projeto Dietrich está em desenvolvimento: o roteiro já foi escrito.

No segundo episódio de Becoming Karl Lagerfeld, a Marlene Dietrich de 70 anos faz uma aparição, interpretada por Sunnyi Melles (Triângulo da tristeza). Nessas alturas, Daniel Brühl encontrou a foto que Karl Lagerfeld tirou dele há 20 anos —  um astro fotografando outro, ou seja, dois sempre é melhor do que um.
 
 
Seis episódios de aprox. 45 minutos cada
País de produção: França
Direção: Jérôme Salle, Audrey Estrougo
Roteiro: Isaure Pisani-Ferry, Dominique Baumard, Jennifer Have, Nathalie Hertzberg 
Elenco: Daniel Brühl, Théodore Pellerin, Arnaud Valois, Alex Lutz, Agnès Jaoui, Lisa Kreuzer

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