Violência policial contra negros, experiências traumáticas de tortura nas ditaduras do último século, perseguição à população LGBT: são muitos os medos – passados e presentes – refletidos nas obras de artistas sul-americanos.
Na vídeo-performance “Apagamento #1” (2017), o artista visual e curador brasileiro Tiago Sant'Ana registra, ao longo de um mês, o crescimento do próprio cabelo que passa então a esconder a palavra “Cabula”, gravada em sua cabeça com navalha. Cabula é o nome de um bairro na periferia da cidade de Salvador, onde 12 jovens negros foram assassinados pela polícia em 2015. “Nesse trabalho falo, entre outras coisas, do processo cruel de extermínio e silenciamento sistêmico da juventude negra nas grandes metrópoles brasileiras. Vidas negras valem muito pouco no Brasil e viver na periferia é viver com medo”, observa Sant'Ana.
“O medo é uma das marcas da nossa sociedade, que sempre foi racista e violenta. Em meu trabalho, busco refletir sobre esse corpo negro silenciado no meio urbano não apenas pelo medo, como pela insegurança”, aponta Dalton Paula, artista também brasileiro, nascido em Brasília e radicado em Goiânia. “A própria arte negra também foi silenciada e tornada invisível ao longo da história do país”, completa.
Tal questão torna-se mais complexa ainda para criadores LGBTs, como alerta Rafael Bqueer, artista visual paraense que vive entre o Rio de Janeiro e São Paulo. “As opressões do pensamento hegemônico recaem sobre nossos corpos desde muito cedo, em muitos casos já na infância”, aponta. “No meu caso, como bicha e pessoa negra, transformo o medo em combustível da luta, da resistência, da minha produção artística”.
A presença do medo nas artes visuais na América do Sul não é, contudo, um fenômeno recente. “Ele aparece de maneira contundente nos anos 1960 e 1970 por causa das ditaduras militares que vigoraram em vários países naquele período, como nos trabalhos do CADA e de Diana Dowek”, observa o crítico, curador e historiador da arte Tiago Mesquita. “São trabalhos que falam sobre violência, tortura, desaparecidos políticos e falta de liberdade”.
Selecionamos aqui algumas obras de artistas sul-americanos que expõem o medo em suas diferentes facetas.