​Losers and Winners

Por Eric Pedott

Estamos ambientados em um refeitório de fábrica durante o intervalo de um trabalho árduo de mais de 12 horas. Trabalhadores chineses assistem televisão. Na cena vemos seus olhares, alguns concentrados enquanto comem, intercalando com a imagem da TV que apresenta um programa intitulado "notícias da china”. O programa tem sua abertura com um compilado de foguetes e satélites, aparatos tecnológicos. A apresentadora de vermelho reporta o primeiro lançamento espacial tripulado da China. O presidente discursa na TV, e alguns dos trabalhadores concentrados parecem ter um semblante de orgulho ao ver tal cena, enquanto outros se mantém distraídos. O discurso do presidente é quase direcionado para os trabalhadores que se encontram ali: “Tenho certeza que você dominará com calma e tranquilidade, com a cabeça clara, corajosamente e energicamente, esta honrosa e maravilhosa missão. Nós lhe desejamos bom êxito, muito sucesso, e esperamos aqui sua volta triunfal”. Logo após esse discurso, os trabalhadores acompanham concentrados as cenas do lançamento do foguete. No exato momento do estouro do lançamento, seus olhares se voltam para um barulho que vem da parte externa do refeitório: uma das torres da fábrica explode! Não estamos na China, no lançamento do foguete, mas em uma fábrica de coque na Alemanha.
 
Losers and Winners (2006), documentário dos diretores alemães Ulrike Franke e Michael Loeken, nos apresenta uma fábrica de coque na Alemanha, que vendida para a China, construindo equivalências e diferenças entre os cenários de desindustrialização de um e desenvolvimentismo do outro. Uma gigantesca fábrica, referência da indústria de combustíveis, é desmontada como fosse feita de brinquedo Lego, peça a peça, e será remontada na China, onde no futuro serão feitas duas semelhantes.
 
A música asiática presente na trilha acentua momentos de contradição quando aparece em algumas cenas dos trabalhadores alemães, como se indicasse um passo a passo dos chineses dão em direção ao progresso. Em outra cena, trabalhadores alemães operam seus computadores em uma sala que ainda não foi desmontada e debatem sobre seu último dia de trabalho: “Daí não venho dizer nem bom dia, só tchau!” rebate um deles. Logo após vemos os chineses trabalhando com uma trilha sonora de fundo, ambientando certo ar de melancolia em relação à perda de trabalho dos alemães, mas de ganho em relação à indústria chinesa. 

Arte de Eric Pedot
© Eric Pedot
Esta melancolia também pode se estender aos chineses, que aparecem cabisbaixos em diversas cenas, e que não reclamam os seus direitos quando são confrontados. Como por exemplo, na cena seguinte ao lançamento do foguete com a qual abro o texto, em que um representante da empresa chinesa se direciona aos trabalhadores e anuncia que devido a reformas administrativas eles não poderão mais receber seus salários em pé de igualdade. “Vamos fazer com que a diferença de renda seja sentida. Não dá pra todo mundo ganhar a mesma coisa”. Mas apesar desses golpes baixos em relação aos trabalhadores, eles parecem manter seu orgulho. Em uma das cenas finais, um pouco antes de estarem prestes a irem a embora e cumprirem com “bom êxito, muito sucesso, em sua volta triunfal”, um dos trabalhadores diz ter orgulho de que agora é possível chegar no padrão de desenvolvimento dos alemães, que agora tem dignidade em dizer de peito aberto “Eu sou chinês! Assim como eles dizem: Nós somos alemães!”.
 
Essa dualidade está sempre presente no documentário, de uma China em desenvolvimento, e de uma Alemanha que parece já ter passado dessa etapa. Tenciona a experiência dos trabalhadores, com baixas e altas expectativas, de ganhos e perdas, mas que não se configura como um jogo de “losers” ou “winners”, e sim de um processo quase circular de passagem relativo à economia industrial de cada país.
 

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