Gustavo Pizzi  A liberdade que incomoda o outro

Os últimos dias de Gilda. Brasil 2020. Direção: Gustavo Pizzi. Na foto: Karine Teles. Berlinale Series 2021.
Os últimos dias de Gilda. Brasil 2020. Direção: Gustavo Pizzi. Na foto: Karine Teles. Berlinale Series 2021. © Marcinho Nunes

“Os últimos dias de Gilda” é a primeira série brasileira a participar da Berlinale. Através da atuação impecável de Karine Teles como protagonista, a série consegue tratar com leveza temas graves do Brasil de hoje. Em entrevista, o diretor Gustavo Pizzi fala sobre seu trabalho.

Por que você decidiu adaptar aa peça “Os últimos dias de Gilda” para uma série?

Depois que assisti, em 2004, o monólogo do Rodrigo de Roure, dirigido por Camilo Pellegrini e com atuação da Karine Teles, eu quis transpor a peça para o audiovisual. Fiquei fascinado em ver aquela mulher livre, corajosa e independente. A ideia sempre foi ser o mais honesto com a essência do texto original e também dialogar com o mundo de agora, tendo em mente um país que passou por um golpe de Estado em 2016 e um mundo onde uma extrema direita fascista ganha cada vez mais espaço.

As milícias e a radicalização religiosa estão em curso no Brasil há anos e agora isso tem se tornado mais visível. Como a série foi recebida no país?

Tivemos uma recepção muito bonita. Foram muitas mensagens de agradecimento por estarmos tratando desse tema dessa maneira. Tenho a sensação de que as pessoas no Brasil e também em outros lugares do mundo estão oscilando entre o medo e a esperança. Assim como Gilda. Muita gente se identifica com a personagem e quer lutar ao lado dela, batendo de frente com aquilo que as oprime e as violenta cotidianamente. A busca por justiça e liberdade une muita gente em muitos lugares desde sempre.


Os últimos dias de Gilda. Brasil 2020. Direção: Gustavo Pizzi. Na foto: Julia Stockler, Higor Campagnaro. Berlinale Series 2021.  Os últimos dias de Gilda. Brasil 2020. Direção: Gustavo Pizzi. Na foto: Julia Stockler, Higor Campagnaro. Berlinale Series 2021.  | © Marcinho Nunes
Com a precarização da produção cultural no país, trabalhar para a TV se tornou uma alternativa possível no audiovisual?


A TV convencional ainda existe, é claro, e vai continuar existindo por muito tempo. Mas esse espaço não supre toda a cadeia da indústria audiovisual. Quem já tem uma posição mais forte no mercado pode sobreviver, mas estamos falando de mais de 300 mil empregos que estão sendo perdidos no Brasil por conta da extinção do audiovisual. Estamos sendo atacados por um governo de extrema direta cujos objetivos são, como em muitos outros lugares, a destruição direcionada a alguns setores historicamente questionadores. O sentimento de país colônia é cada vez mais evidente aqui entre nós depois de alguns anos de avanços significativos.